<img src=”img/blig/softlivre.jpg”align=”right” border=”2” alt=”Software Livre e Inclusão Digital”>Uma das grandes virtudes da comunidade do software livre é seu primor pela excelência técnica. Infelizmente, este é o catalisador do que é possívelmente seu maior vício: a disposição que este pessoal tem para dizer bobagens sobre assuntos que pouco entendem – desde o software do concorrente até ética e geopolítica.
Joel Spolsky demostrou um exemplo disto em sua brilhante análise do livro The Art Of UNIX Programming. É claro que não é preciso ir tão longe para perceber que, para cada insight inteligente que o Eric Raymond tem, ele diz umas cinco dúzias de abobrinhas.
Como de costume, Joel extrapolou o objetivo original, culminando em uma radiografia precisa das principais diferenças entre os desenvolvedores Windows e UNIX – e isto ajuda a entender melhor as motivações por trás dos usuários de cada um dos sistemas. O que veio em boa hora, já que eu estava lendo dois livros sobre o assunto:
Software Livre e Inclusão Digital é uma coletânea de autores diversos, que foca muito mais na questão da inclusão digital no Brasil do que nos aspectos técnicos do software livre. O mérito está no enfoque local, em tentar entender como o software livre ajudou e pode ajudar nesta questão – é um pouco chover no molhado, mas vale o exercício.
Boa parte dos textos são de pessoas ligadas a iniciativas já em andamento – um tom panfletário é inevitável, já que muitas destas ações partiram de prefeituras e governos ligados a um mesmo partido, o PT. O lado positivo é que isto torna possível conhecer detalhes de ações como os Telecentros – tanto das especificações técnicas quanto do perfil de uso e resultados práticos.
A maior parte dos textos tem um tom mais acadêmico, o que, embora facilite seu uso como ferramenta de divulgação e sustentação, os torna bastante enfadonhos. Vale mais como consulta do que como leitura de capa a capa.
<img src=”img/blig/soporprazer.jpg”align=”left” border=”1” alt=”Só Por Prazer - Linux: os bastidores de sua criação”>Em contrapartida, Só Por Prazer, a autobiografia de Linus Torvalds, é um livro divertidíssimo. Com um bom papo que rivaliza Steve Jobs (aliás, o episódio do chega-pra-lá no Jobs já vale a leitura), ele narra em detalhes sua vida até o “estrelato”. Linus usa um ghost writer que nem é tão ghost assim, o que dá uma boa credibilidade.
Os detalhes é que são a parte interessante. Por exemplo, muito do que ele aprendeu de Assembly se deu graças à pouca disponibilidade de software para o Sinclair QL, seu segundo computador (o primeiro foi um VIC-20). E o surgimento do Linux tal como ele é se deu devido à sua vontade de aprender detalhes sobre o 386, só isso.
Linus se dedica bastante a desfazer o mito do supergênio, que conhece desde sempre o alfa e o ômega da computação. Claro, ele é, sem dúvida, um programador “olho de tigre”, e seu trabalho está aí, mas muito do que ele colocou no kernel do Linux foi aprendido em campo, enquanto a coisa ia acontecendo.
Fica evidente que ele tem muito mais bom senso que a maioria dos porta-vozes do software livre. Por exemplo: ao contrário de Stallman, que prega que todo software deveria ser livre e ponto, Linus deixa claro que o direito do programador de fazer o que bem entender com o fruto do seu trabalho (inclusive patenteá-lo, se quiser) está acima disto.
Correndo o risco de abalar os defensores da “meritocracia”, não há como deixar de notar a relação entre esta coerência/serenidade e o fato de ele ser um cara resolvido, casado, pai de família, etc., em oposição ao estereótipo comumente atribuído aos desenvolvedores UNIX. Afinal, é difícil querer dizer para os outros como o mundo deve funcionar se a sua vida pessoal (ou falta de) é um desastre.