Andar de ônibus em São Paulo não é nenhuma maravilha. Mas os piores perrengues não se comparam à soma das pequenas irritações causadas por este esporte coletivo espartano que é possuir/dirigir um carro particular, tais como:
- Ficar parado no trânsito (sem poder ler, jogar ou navegar);
- Morrer em uma grana no seguro e não usar;
- Morrer em uma grana no seguro, usar uma única vez e ver que no ano seguinte ele aumentou em 50% por causa disso;
- Pagar IPVA, seguro obrigatório e nem lembro mais quais taxas;
- Fazer inspeção veicular (mais tempo e dinheiro no ralo);
- Preço da gasolina (que sobe automaticamente em qualquer crise, mas raramente cai quando está tudo bem);
- Pagar a mensalidade do estacionamento no trabalho (ou ter que negociar um benefício útil no emprego no lugar disso);
- Comparar o rendimento do valor do carro num investimento com a depreciação ano a ano dele;
- Lavar ou mandar lavar (ainda que o fizesse trimestralmente, confesso);
- Trocar o óleo a cada x km;
- Trocar pastilhas/filtros/repimbocas/etc a cada y/z/k/m km ou meses (e gerenciar esse calendário todo);
- Fazer revisão obrigatória (que nunca é na hora, nem perto de casa ou do trabalho);
- O “barulhinho” que surge do nada e que anuncia que uma hora ele vai te deixar na mão (a pior possível);
- As vinte opiniões amadoras sobre o barulhinho;
- As cinco opiniões diferentes dos cinco mecânicos consultados sobre o barulhinho;
- O custo e o tempo para consertar o barulinho;
- O retorno do barulhinho (não antes de 4h ou 50KM de distância da oficina);
- O tempo perdido tentando aprender mecânica de automóveis ao invés de algo mais relevante para a sua vida, na (vã) esperança de ser menos enrolado pelos mecânicos;
- Fazer rodízio dos pneus;
- Procurar lugar pra estacionar;
- Ficar pensando “será que ele ainda está onde eu estacionei?”
- Pagar estacionamento avulso, ou…
- …decidir se deixa uma grana para o cara que vai “cuidar” (se pagar, você perpetua a extorsão, se não pagar fica pensando no que vai acontecer com o carro);
- Encontrar o vidro quebrado, gastando uns R$ 200 por causa de um item de R$ 20 que estava no banco traseiro;
- Queimar uma grana num CD/MP3 player caro (que pode motivar o item anterior) ou escolher entre música pasteurizada de FM e as mesmas notícias repetidas a cada 15 minutos;
- Tentar lembrar em que andar/vaga do shopping center você deixou o carro;
- Andar (ou não) com os documentos;
- “Efeito estufa” nos dias quentes;
- Pequenos acidentes – esse item vale por muitos:
- Discussão loser com o outro Sr. Volante (independente de quem tem culpa);
- Fazer o Boletim de Ocorrência;
- Acionar o seguro;
- Fazer orçamento de conserto;
- Saber que aquela parte nunca vai ficar exatamente do jeito que era;
- Vidro elétrico que emperra no pior lugar possível (ex.: não fecha quando você está na rua ou na chuva);
- Carteira de motorista que vence quando você está totalmente sem tempo para ir atrás (e cuja renovação sempre envolve um novo exame ou burocracia em um lugar totalmente distante);
- Ser o chato que não deixa o carona fumar ou aturar a aura de nicotina durante o resto da semana;
- Acordar cedo (ou voltar tarde) uma vez por semana por causa do rodízio – e ainda tentar se enganar com consolos do tipo “ah, hoje eu pego menos trânsito”;
- Pequenos defeitos que “não vale a pena” terceirzar e você tem que resolver. Ex.: lâmpada do pisca queimada;
- Ser multado porque não percebeu um desses pequenos defeitos (ou ainda, causar um acidente por conta dele);
- Pegar uma lombada/buraco e quase sentir na pele a “dor” no carro – além de passar os próximos minutos tenso com a possível falha mecânica decorrente;
- Pagar pedágio como se fosse um viciado: quantidades cada vez maiores, em intervalos cada vez menores;
- Ficar “na mão” com uma falha mecânica e não poder simplesmente abandonar o veículo e pegar o próximo (como faria com um coletivo);
- Se você mora numa rua com feira livre (como os meus pais), acordar de madrugada uma vez por semana para tirar o carro, ou ficar com ele preso até o meio da tarde;
- Abastecer um mísero dia com gasolina de baixa qualidade e aturar o carro engasgando durante o resto da semana (isso se não tiver que trocar algum filtro ou rolar um defeito ainda mais $ério);
- Medos: furto, colisão grave, atropelamento, assalto no farol, sequestro-relâmpago, falso bloqueio policial, ficar preso em enchente, respirar poluição sem ter para onde fugir… enfim, medo de viver. Estou fora.
Comments
Dine
Só pra criar a discórida, vou falar das coisas que irritam usando transporte público.
- Não é muito fácil esperando e depois pegar o ônibus/metrô/trem lotado sem conseguir respirar direito.
- Quando tem alagamentos, eles também param e atrasam por isso.
- Dependendo do trajeto, já ouvi pessoas falando que levam em média menos da metade do tempo indo de carro, mesmo com todo o trânsito.
- Medo também dá pra ficar, por estar carregando um HD na mochila, ou de usar seu celular pra acessar a internet ou ouvir uma música. (Obs: já fui assaltada e roubada mais vezes a pé do que de carro. Devo ter cara de idiota. *rs)
- Ao mesmo tempo que vc tá com medo de usar seu celular, algumas pessoas não tem vergonha nenhuma em ouvir aquela música que vc odeia no volume máximo e sem fones. :)
- Ficar pensando no que o colega atrás de vc está carregando no bolso que cresce quando ele encosta em vc! :P
- Ficar sentindo o cheiro do amigo que não tomou banho do seu lado. A minha altura por exemplo é na altura do suvaco da média.
- Pras mulheres, se quiserem ou forem obrigadas a ser "peruas" no trabalho, tem que carregar uma mala a parte com sapato de salto, maquiagem, etc. Fora ter que levar sempre um guarda-chuva.
- Sem ter carro, num dia que vc está atrasado e chovendo, se resolver pegar um taxi vai sofrer pra conseguir um.
- Pra grande maioria o valor da gasolina/seguro/estacionamento não vale a pena, mas não sei se isso é válido pra todo mundo, dependendo do quanto a pessoa usa o carro ou onde mora.
Enfim, a lista foi menor que a sua e bem pessimista, mas acho que é por isso que tem tanta gente disposta a pagar mais caro pra ter esse meio de transporte mais "confortável" e egoísta.
Michel
A maioria das reclamações sobre o transporte público sempre estão atreladas ao ítem necessário para qualquer ser humano: conforto.
Andando de ônibus pude perceber que as linhas que estão dentro do centro expandido (aquela área do rodízio) são sempre as mais confortáveis, com mais opções de ônibus e itinerários, mas quem precisa pegar um ônibus lá no Parelheiros (leia-se, extremo, extremo sul) já não tem a mesma facilidade pois não tem muita linha de ônibus e veículos disponíveis. Ainda mais quanto tem greve, quem precisa mais sempre é o mais atingido.
Também acho que deveríamos ter uma política maior para o transporte público, privilegiando sempre o uso do trem/metrô/ônibus. Mas infelizmente hoje quem puder pegar um carro e ir pro trabalho mesmo tendo que fazer as contas no final-do-mês, para pagar seguro, gasolina, etc, as pessoas acabam preferindo o conforto do carro do que o rala-rala no busão.
chester
Eu sei que vai parecer estranho, mas eu juro que não tinha lá muita intenção de comparar transporte público com automóvel nesse post - eu realmente fiquei lembrando das coisas bestas que eu não tenho mais que passar depois que desencanei de ter carro, e a lista se escreveu sozinha! :-)
Posto isso, acho que cada um tem que ver o que é melhor pra si - ou, no caso de São Paulo, o que é menos pior. No meu caso, eu invisto parte do dinheiro economizado em morar em lugares mais estratégicos. Pra mim funciona, mas sei que pra algumas pessoas não.
Wilerson
Somos dois. O mais legal dessa estratégia é que, em um caso que o transporte público não atenda as necessidades do momento, um táxi não sai tão caro.
Outro detalhe de não ter carro é a liberdade que se tem de poder beber e não ter de se preocupar em ser multado/causar um acidente. :P
Willian Cruz
Chester, vejo que você entende perfeitamente por que eu desisti de dirigir e adotei a bicicleta. Sei que você até tentou usá-la e não se adaptou, mas fico feliz de ver que fez outra escolha inteligente e que é boa para você, para a cidade, a saúde coletiva e o meio ambiente, mesmo que a motivação maior tenha sido pessoal (como também foi a minha).
Para quem quiser entender melhor o que faz alguém vender um carro bom para usar bicicleta, transporte público e, eventualmente, táxi, veja aqui: http://j.mp/aEeFhT
Fabiano Silos
Legal essa página. Todo mundo que fala pra mim que vai comprar um carro eu apresento esse panfleto pro cara refletir um pouco.
Fabiano Silos
http://noticias.uol.com.br/...
Ila Fox
Eu só queria saber dirigir para poder alugar um carro durante uma viagem (já que em alguns países transporte publico e taxi são chatinhos de encontrar).
Ah, e tbm pq tenho o sonho secreto adolescente de fazer uma viagem de carro numa destas auto estradas internacionais. ;-)
chester
Heh, eu tinha esquecido dessa idéia de viagem pelas estradas vicinais, até você mencionar! Ainda bem que mantenho a carteira de motorista (na real porque é mais compacta que a identidade).
Angela
Se você só precisa de carro nos fins-de-semana, alugar fica infinitamente mais barato. E elimina váááários dos problemas, como o medo de abastecer com gasolina vagabunda, pagar seguro, IPVA e outras mil-e-uma taxas. Carro sempre novinho e você sempre feliz.
chester
Pois é... mas ainda tem que dirigir ele! :-)
Por outro lado, estou quase me rendendo à idéia de alugar para eventualidades. Fiz isso uma vez ou duas no passado e deu muito certo.